segunda-feira, 21 de março de 2011

Dia Mundial da Poesia


   Um poema

  Não tenhas medo, ouve:           
  É um poema
  Um misto de oração e de feitiço…
  Sem qualquer compromisso,
  Ouve-o atentamente,
  De coração lavado.
  E rezá-lo
  Ao deitar
  Ao levantar,
  Ou nas restantes horas de tristeza.
  Na segurança certeza
  De que mal não te faz.
  E pode acontecer que te dê paz…
                                                               Miguel Torga
                                                                               Gravura Inessa Garmash       

quinta-feira, 17 de março de 2011

Recordando Elis Regina (17.03.45 - 19.01.82)



Águas de Março
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol
É peroba do campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o MatitaPereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira
É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira
É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão
É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto o desgosto, é um pouco sozinho
É um estrepe, é um prego, é uma ponta, é um ponto
É um pingo pingando, é uma conta, é um conto
É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando
É a luz da manhã, é o tijolo chegando
É a lenha, é o dia, é o fim da picada
É a garrafa de cana, o estilhaço na estrada
É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
É uma cobra, é um pau, é João, é José
É um espinho na mão, é um corte no pé
São as águas de março fechando o verão,
É a promessa de vida no teu coração
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um belo horizonte, é uma febre terçã
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
pau, pedra, fim, caminho
resto, toco, pouco, sozinho
caco, vidro, vida, sol, noite, morte, laço, anzol
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração.


                                                                                                                                                 Tom Jobim

quarta-feira, 16 de março de 2011

Jardim




Olhando as estrelicias

Casa algarvia







CASA ALGARVIA:


a barrinha azul ao comprido da fachada
                                                   branca
                                                                 é para rimar
                                                    com o debrum a mar
                                                     ao longo
                                                      do horizonte

                                                       Azul
                                                                   rima
                                                                                com Sul

                             
                                                                                             Teresa Rita Lopes  O Sul dos meus  Sonhos


terça-feira, 8 de março de 2011

Dia Internacional da Mulher

                                                      Quadro de Michael e Inessa Garmash



Gosto das mulheres que envelhecem

Gosto das
mulheres que envelhecem,
com a pressa das suas rugas, os cabelos
caídos pelos ombros negros do vestido,
o olhar que se perde na tristeza
dos reposteiros. Essas mulheres sentam-se
nos cantos das salas, olham para fora,
para o átrio que não vejo, de onde estou,
embora adivinhe aí a presença de
outras mulheres, sentadas em bancos
de madeira, folheando revistas
baratas. As mulheres que envelhecem

sentem que as olho, que admiro os seus gestos

lentos, que amo o trabalho subterrâneo
do tempo nos seus seios. Por isso esperam
que o dia corra nesta sala sem luz,
evitam sair para a rua, e dizem baixo,
por vezes, essa elegia que só os seus lábios
podem cantar.

Nuno Júdice